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China investe para se tornar líder global em geração de energia verde

OESP, Economia, p. B10
29 de Nov de 2009

China investe para se tornar líder global em geração de energia verde
Hoje, país é o que mais emite gases de efeito estufa, além de ter 70% de seus rios, lagos e reservatórios contaminados

Cláudia Trevisan

A China é o país que mais emite gases que provocam o efeito estufa, tem 17 das 25 cidades mais poluídas do mundo e 70% de seus rios, lagos e reservatórios estão contaminados. Tudo isso é verdade. Mas o país asiático também investe bilhões em tecnologias verdes e caminha rapidamente para se tornar um líder do setor, com a meta de ter 20% de sua energia retirada de fontes renováveis em 2020.

As autoridades chinesas concluíram que os problemas ambientais podem comprometer o próprio desenvolvimento do país e afetar a estabilidade social que tanto prezam. Afinal, nada menos que 720 milhões de seus 1,3 bilhão de habitantes vivem na zona rural e dependem de terras e águas cada vez mais ameaçadas pela poluição.

Além disso, a expansão de tecnologias verdes é considerada uma poderosa fonte de crescimento econômico, que ganhou ainda mais importância com a retração da demanda mundial por exportações chinesas a partir de 2008, em razão da crise financeira global.

O potencial do setor é grande o bastante para amenizar as divisões entre as duas principais correntes do Partido Comunista - a que defende o crescimento acima de tudo e a que também se preocupa com aspectos ambientais e sociais. "Eles resolveram o conflito quando concluíram que a revolução verde é a nova revolução industrial e a grande fonte de crescimento do século 21. O governo está colocando bilhões de dólares nesse setor", observa Sidney Rittenber, consultor norte-americano que se filiou ao PC chinês nos anos 40, participou da Revolução de 1949 e viveu no país até o fim dos anos 70.

Entidade que reúne multinacionais, ONGs, investidores, representantes de governos e especialistas que atuam na área de energia renovável, a China Greentech Initiative acredita que esse mercado poderá ter movimento anual de US$ 500 bilhões a US$ 1 trilhão em 2013, o que na cifra mais alta representaria 15% do PIB chinês previsto para aquele ano.

Os investimentos crescem a um ritmo muito superior ao da expansão da economia e receberam impulso adicional com o pacote de estímulo de US$ 586 bilhões anunciado por Pequim em novembro de 2008, logo depois da eclosão da crise global. Nada menos que 37% desses recursos são destinados a projetos na área de tecnologias verdes, estima a China Greentech Initiative.

POTÊNCIA AMBIENTAL

O World Watch Institute, com sede em Washington, se refere à China como uma "potência ambiental emergente" e afirma que o país caminha para se tornar o líder global em energia renovável, conceito que abrange todas as fontes que utilizam recursos inesgotáveis da natureza como sol, vento e água corrente. Os ambientalistas costumam excluir da classificação as grandes usinas hidrelétricas, em razão do impacto negativo delas sobre o ecossistema.

Em 2007, os chineses investiram US$ 12 bilhões em energia renovável, cifra que só ficou atrás dos US$ 14 bilhões registrados na Alemanha e representou 12% do total desembolsado em todo o mundo naquele ano.

A China dobrou a capacidade instalada para produção de energia eólica em cada um dos últimos cinco anos e caminha para ter a segunda maior potência mundial em 2010, atrás apenas dos Estados Unidos, com geração de 30 GW (gigawatts) - meta que será atingida uma década antes do previsto.

Agora, Pequim trabalha para gerar 100 GW com utilização do vento em 2020, cifra que equivale a toda a capacidade instalada de geração de energia do Brasil, incluindo Itaipu, que gera 14 GW.

"O investimento em energia eólica disparou na China. É um negócio gigantesco e a quantidade de plantas que eles estão construindo é a maior em todo o mundo", afirma o brasileiro Paulo Soares, que há dez anos vive no país e, há cinco, comanda a operação local da indiana Suzlon, uma das líderes globais do setor.

Em 2005, a empresa tinha três pessoas na China, incluindo Soares. Hoje, são 100, muitas das quais trabalhando na única grande fábrica da Suzlon fora da Índia. A decisão de produzir na China foi adotada em razão da exigência do governo de que 70% dos equipamentos tenham conteúdo nacional. Para os demais países, incluindo o Brasil, a Suzlon exporta turbinas fabricadas na Índia. Soares ressalta ainda que a China tem o maior potencial eólico do mundo, com 250 GW em terra e 750 GW no mar.

Os chineses já são os líderes mundiais na utilização de painéis solares para aquecimento de água, com 67% da capacidade instalada no planeta, de acordo com o Renewable Energy and Policy Network for the 21st Century (REN21).

Cerca de 10% das famílias chinesas se valem do sol para aquecer a água que utilizam em suas casas. A meta do governo é dobrar o porcentual até 2020. Na avaliação da Agência Internacional de Energia, esse sistema evitou a emissão de 14 milhões de toneladas de dióxido de carbono em 2005. As emissões globais da China atingiram no ano ado 6,9 bilhões de toneladas, o equivalente a 20% do total mundial.

Aposta do país em ecologia faz florescer as ecofortunas

O estímulo oficial ao desenvolvimento de tecnologias verdes levou ao surgimento de ecobilionários, que enriquecem graças à fabricação de produtos "ecologicamente corretos".

A lista das fortunas chinesas de 2009 é liderada por Wang Chuanfu, dono da BYD, a primeira empresa do mundo a produzir em larga escala carros movidos a baterias que podem ser recarregadas na tomada da casa do dono do carro.

A BYD é uma das grandes promessas entre as empresas chinesas de energia limpa. A fortuna de Wang Chuanfu, de 43 anos, saltou de US$ 880 milhões no ano ado para US$ 5,1 bilhões em 2009, depois que o megainvestidor norte-americano Warren Buffett comprou 10% da empresa.

Sua ambição é transformar a BYD na maior fabricante de carros do mundo até 2025. A companhia tem a vantagem de contar com enorme potencial em casa. A China ultraou os Estados Unidos neste ano e se tornou o maior mercado automobilístico do mundo, com 10 milhões de carros vendidos até outubro.

ENERGIA SOLAR

A energia solar é outra indústria que sustentou a construção de fortunas na China. Shi Zhengrong, dono da Suntech Power, aparece em 58 lugar no ranking de ricos chineses da revista Forbes deste ano, com patrimônio de US$ 1,1 bilhão. Sua empresa está entre as dez maiores fabricantes de equipamentos para energia solar do mundo.

Apesar de a China exportar a maior parte dos painéis fotovoltaicos, a situação começa a mudar, com o desenvolvimento de plantas locais ligadas à rede de transmissão de energia.

Neste ano, o país anunciou a construção do maior projeto de geração de energia solar, na província de Qinghai, na região oeste. O empreendimento começará com a produção de 30 MW, que será elevada a 1 GW no futuro.

O brasileiro Paulo Soares, presidente da Suzlon China, ressalta que a estratégia do governo de Pequim é desenvolver fornecedores locais de equipamentos de energia renovável.

O setor eólico é um bom retrato do impacto das políticas oficiais. Em 2004, 60% do mercado era dominado por empresas estrangeiras, índice que caiu para 15% em 2009.

País tem de gerar ''uma Inglaterra'' por ano

Em 2008, a China teve de construir 90,5 GW de geração, mais do que os 79 GW dos britânicos

Com 20% da população do planeta e um ritmo de crescimento que se mantém alto mesmo em tempos de crise global, a China tem de aumentar a sua geração de energia a cada ano, numa extensão que supera toda a capacidade instalada da Inglaterra.

Só no ano ado a China teve de construir 90,5 gigawatts (GW) de geração, mais que os 79 GW de capacidade total dos britânicos. O país asiático já é o segundo maior consumidor de energia do mundo e, em breve, vai superar os Estados Unidos.

De 2006 a 2030, a capacidade de geração da China deverá ar de 518 GW para 1.510 GW. No mesmo período, os americanos aumentarão sua oferta de energia de 959 GW para 1.201 GW, segundo o International Energy Outlook de 2009, editado pelo governo do país.

Maior poluidor do mundo, a China também tem a maior capacidade instalada para produção de energia renovável - 76 GW -, graças principalmente a pequenas hidrelétricas, que produziam 60 GW, segundo dados relativos a 2008.

O grande problema é que 70% da energia gerada no país vêm do carvão, de longe o mais poluente dos combustíveis fósseis. O China Greentech Initiative estima que a média mundial de participação do carvão na matriz energética não chega a 30%. Apesar da importância que as tecnologias verdes ganharam no planejamento estratégico de Pequim, o país continua a construir a cada semana duas termoelétricas geradas a carvão com capacidade de 500 megawatts (MW) cada uma. Do total de emissões da China, 80% vêm da queima de carvão.

O ritmo de crescimento do país, aliado ao uso de combustíveis poluentes, tem impacto que ultraa suas fronteiras. Segundo o World Watch Institute, a China respondeu por 57% do aumento nas emissões de gases que provocam o efeito estufa de 2000 a 2007.

As autoridades de Pequim sabem que esse ritmo é insustentável e, por isso, elevaram o desenvolvimento de fontes renováveis de energia ao topo de suas prioridades. Além de expandir a geração eólica e solar, a China investe em biomassa e planeja aumentar a capacidade de geração dessa tecnologia de 2 GW para 30 GW em 2020.

Também continuará a construir hidrelétricas de pequeno, médio e grande portes, com o objetivo de produzir 300 GW em 2020, comparados a 117 GW de 2005. Mesmo com o investimento em tecnologias verdes, o carvão continuará a ser o principal pilar da produção de energia do país nos próximos anos.

A China cresce a uma média anual de 9,6% há três décadas e a maioria dos analistas espera que mantenha um ritmo de 8% ao ano por pelo menos mais dez anos. Essa expansão é acompanhada de um maciço processo de urbanização, com a construção de prédios e infraestrutura de transportes, telecomunicações, iluminação e saneamento.

Apesar do crescimento dos últimos 30 anos, 55% da população chinesa ainda vivem na zona rural. A expectativa é que o indicador atinja 75% em 2050, o que significará mais 500 milhões de pessoas nas cidades, quase três vezes o total de habitantes do Brasil. Esse colossal processo de urbanização exigirá 40 bilhões de metros quadrados de área construída até 2025, o que duplicará a extensão das construções em relação a 2025, segundo a consultoria McKinsey.

A urbanização e o crescimento da renda levarão ao aumento do consumo e das emissões per capita dos chineses, que hoje equivalem a um quarto da dos americanos. A China assumiu em 2006 a liderança no ranking dos países que mais emitem gases que provocam efeito estufa, mas cada um de seus habitantes polui muito menos que um morador dos EUA. Em 2007, a emissão per capita do chinês foi de 5,1 toneladas, ante 19,4 toneladas do americano.

OESP, 29/11/2009, Economia, p. B10

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